Um Elefante no Alentejo

O que é que um elefante albino que viveu no século XVI tem a ver com uma pequena ermida em ruínas, à beira do rio Almansor, em Montemor-o-Novo?

Hanno nasceu em 1510, em Cochim, na Índia. Quatro anos depois, chegou a Lisboa num barco, acompanhado do seu tratador, sendo recebido com pompa e circustância pela corte de D. Manuel I. Como parte das celebrações da sua coroação, o rei português decidiu oferecê-lo ao papa Leão X. E assim, o elefante embarcou numa jornada épica  pela Europa até Roma, despertando espanto e admiração por onde quer que passava.

Mas o que é que o pobre elefante, vítima da vaidade e necessidade de ostentação humana, tem a ver com a Ermida de São Pedro da Ribeira? Uma ermida que se crê existir desde o século XIV e que, ao longo da história foi alvo de restauros até hoje estar – literalmente – a cair no esquecimento (embora já exista um plano de reabilitação).

A ligação está no altar-mor que, até 1975, era composto por um retábulo de madeira. No verão desse ano, foi decidido que a peça ficaria melhor na Igreja do Calvário, situada num lugar mais central da cidade alentejana. Quando o retábulo foi retirado, deixou a descoberto uma preciosidade rara: todos aqueles anos, o retábulo escondeu (e protegeu da erosão do tempo) um mural que deixou todos espantados. Não tanto pela figura central de São Pedro com as chaves do Reino na mão, nem pelas magníficas representações da paisagem alentejana e das suas atividades rurais. O que mais surpreendeu foi a presença destacada de um enorme elefante branco, acompanhado pelo seu tratador indiano.

Diz a lenda que o autor do mural, ao fazer uma pausa para se refrescar nas águas do rio, deparou-se com o elefante, também ele numa pausa, antes de prosseguir a sua longa viagem até Roma. A visão improvável do animal impressionou-o tanto, que o pintor não resistiu a eternizá-lo na obra, enquadrado na paisagem alentejana. E lá está ele até hoje, um paquiderme como a figura mais famosa de uma ermida que, ao honrar São Pedro, o guardião das portas do Céu, também honra o encontro entre a criatividade humana e as maravilhas inesperadas da vida.  

E ainda bem que assim é. Porque, mesmo na nossa necessidade de homenagem e honra à transcendência e ao divino, é provavelmente quando saímos fora da caixa que nos vamos sentir tocados por Ele. 

A Ermida está, por enquanto encerrada, à espera da merecida reabilitação. Mas pode ser visitada virtualmente neste link

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